Ser criança nos anos 80
Apresento programas de televisão desde os 3 anos. No terraço da casa dos meus pais, em frente à janela, cujo reflexo servia para eu ver se a emissão estava a correr bem, era apresentadora de programas de entretenimento como os “Jogos sem fronteiras”, “Um dois três” e, mais tarde, o “Chuva de Estrelas”, entre outros. Foram tantos que já nem me lembro.
Pertenço à geração de crianças que eram crianças. Brincava na rua até as luzes dos candeeiros da iluminação pública acenderem e a minha mãe pertencia à brigada da chamada à varanda com o grito: “andreia anda já jantar!”
Percorria a vila na minha bicicleta bmx de marca branca com almofadas amarelas e pneus rosa choque, andava nos circuitos improvisados em terra batida que incluíam túneis formados por silvas e tábuas a fazer de ponte, junto ao parque infantil do meu bairro. Jogava à bola com os rapazes e esfolava os joelhos a jogar às escondidas, tal não era a pressa que tinha em me esconder. Andava de baloiço mesmo naqueles que hoje são proibidos existir nos parques infantis, bebia água da fonte que mais tarde se descobriu que era imprópria para consumo.
Ia para a escola a pé desde os quatro anos porque, segundo a minha mãe me contou, no primeiro dia de aulas, quando me entregou de coração apertado às educadoras, eu lhe respondi que se podia ir embora porque já sabia o caminho para casa e assim foi até ao final do 4º ano. E não pensem que o percurso não era perigoso: atravessava um carreiro em terra batida, onde tinha de ter muito cuidado para não parar à ribeira que passava mesmo ao lado.
E ainda me lembro das festas de anos na Pastelaria Rosa que tinham direito a um bolo à nossa escolha e um sumo…ainda sinto o sabor daqueles croissants com chocolate acabados de fazer ou dos pastéis de nata!
Brincava às lojas e as casinhas nos muros da casa dos meus pais que serviam de balcão com caixa registadora a fingir, produtos imaginários e clientes exigentes que só existiam na minha imaginação. Noutros dias era empregada de escritório e noutros era apenas professora dos meus “carecas” (nome dos anos 80 para nenucos) que teimavam em querer aprender. Os desenhos animados só davam ao sábado e ao domingo de manhã e chorava sempre que acabavam como se fosse a maior desgraça da semana!
Tive uma infância feliz graças aos meus pais que me deram a oportunidade de brincar. “Mãe, gosto tanto, tanto de brincar. Nunca me canso. E quando deixar de gostar?” – esta era a minha verdadeira preocupação diária! Vidas! Hoje sinto que ainda tenho um pouco dessa criança em mim e não a quero perder porque um dia quero dar a mesma oportunidade para que as minhas crianças sejam realmente crianças!